Enquadramento do Buraco Roto - Parte 3 de 4

A idade não perdoa ---- ou ---- Antes quero partir que dobrar

3 – Enquadramento tectónico

 

3.1 Introdução

 

É relevante a importância da tectónica no bordo ocidental do Planalto de S. Mamede nomeadamente ao longo do seu contacto com a depressão de Alqueidão (Falha de Reguengo do Fetal).

Esta zona localiza-se no Setor Central da Bacia Lusitânica (BL) em cuja evolução ocorreram vários episódios tectónicos distensivos desde o Triásico Superior ao final do Cretácico (Aptiano superior) e, a partir do Cretácico superior, essa evolução passou a margem passiva.

 

Os episódios de rifting na BL enquadram-se no intervalo correspondente ao período distensivo e, de uma forma genérica, considera-se um primeiro episódio principal (alguns autores subdividem em dois) desde o Triásico ao Jurássico superior, outro durante o Jurássico superior e o último episódio de rifting durante o Cretácico inferior até ao momento da oceanização no Aptiano (KULLBERG e MACHADO - 2006).

A Falha de Reguengo do Fetal de orientação NNE-SSW terá funcionado como falha normal, com abatimento do bloco oeste, durante o período distensivo mesozoico. Durante este período o bloco a teto ou seja o Planalto de S. Mamede sofreu uma estruturação em roll over (anticlinal amplo orientado segundo NW-SE) resultante da atividade, a sul, do sistema de falhas escalonadas de Alvados e Minde (NW-SE).

 

A Falha de Reguengo do Fetal, enraizada no soco, desempenhou um aparente papel como fronteira às movimentações halocinéticas iniciadas no Jurássico Médio e que se prolongaram até ao Pliocénico, preservando dos efeitos resultantes das compressões a elas associados os depósitos mais profundos de idade hetangiana, com 2100m de espessura (soco a 3391,59m) e os suprajacentes do Planalto de S. Mamede.

No entanto a sua estruturação tectónica evidencia quer as ações do período distensivo mesozoico quer do regime compressivo pós Cretácico.

Segundo CARVALHO (2013) o episódio de diaclasamento mais antigo corresponde à instalação por todo o MCE, nos afloramentos do Jurássico médio, de uma família de veios de calcite pouco persistentes e orientados segundo NNE- SSW pois estes estão cortados por todas as restantes fraturas.

 

MANUPELLA et al. (2000) pág. 103 refere:” No caso concreto da Falha de Reguengo do Fetal, o facto de o Cretácico inferior assentar diferencialmente sobre diferentes unidades litostratigráficas do Jurássico superior, a teto desta falha, sugere a existência de uma estruturação tectónica anterior à deposição do Cretácico inferior, ou seja, atividade da Falha Reguengo do Fetal durante o Jurássico superior.

Apresentamos de seguida uma síntese desta evolução tectónica no Cenozoico em Portugal continental recolhida em CUNHA et al, (2009).

 

Durante o Cenozóico toda a Península Ibérica esteve sob intensa deformação compressiva. A uma primeira deformação, de compressão máxima, com orientação N-S seguiu-se, desde o Miocénico final uma rotação para NW-SE. Em Portugal é evidente a existência de um episódio compressivo importante associado ao auge da compressão bética a meados do Tortoriano (há cerca de 9,5 Ma). No Plistocénico a continuação do soerguimento tectónico regional e os períodos de baixo nível do mar foram determinantes no progressivo encaixe da rede hidrográfica e no desenvolvimento de capturas fluviais.

3.2 – Síntese da fracturação

Têm sido realizados, nos últimos anos, importantes trabalhos sobre a fracturação no MCE nomeadamente a Tese de Doutoramento de Jorge M. F. Carvalho (2013). A sistematização dos dados foi baseada num cuidadoso trabalho de campo que inclui duas estações de amostragem na zona deste nosso trabalho (nºs. 20 e 21). Em cada uma delas foram feitas várias scanlines bem como uma síntese do diaclasamento local. O detalhe na sistematização dos dados é bastante abrangente pelo que foi, naturalmente, a referência por nós escolhida.

 

Figura Nº 3.1 – Adaptação do mapa dos locais estudados por CARVALHO (2013) referente ao Concelho da Batalha e alguns concelhos limítrofes.

 

A compilação, normalização e sistematização de dados (anexo 6 - CARVALHO 2013) permitiu ao autor elaborar para cada estação um diagrama de rosa onde estes são evidenciados graficamente, caracterizando a fracturação nessa zona, e permitindo observar as variações em relação a estações próximas.

 

Figura Nº 3.2 – Adaptação do mapa dos locais estudados por CARVALHO (2013) referente ao Concelho da Batalha

e alguns concelhos limítrofes apresentando em cada um o diagrama de rosa correspondente.

 

Para o Planalto de S. Mamede este autor apresenta ainda uma compilação por tipo de indicador tectónico (diáclases, veios calcíticos, planos estilolíticos e diáclases reativadas) também agrupados, cada um deles, no respetivo diagrama de rosa.

 

Figura Nº 3.3 – Fracturação no Planalto de S. Mamede discriminada quanto à sua natureza

(a roseta correspondenteao total dos dados não inclui os estilólitos (CARVALHO 2013).

 

Na discussão da análise setorial este autor apresenta os padrões de diaclasamento de cada domínio em função da natureza das diáclases presentes.

 

Figura Nº 3.4 – Adaptado do Mapa dos domínios de igual padrão de diaclasamento no MCE (CARVALHO 2013)

3.3 – Evolução Morfoestrutural local

 

A escarpa de falha de Reguengo do Fetal apresenta em alguns locais, ao longo da sua extensão zonas onde se pode observar o espelho de falha relativamente bem preservado. Em alguns pontos são identificáveis as estrias indicadoras da direção do movimento. Está exposto nas imediações da povoação que dá o nome à falha, parece estar presente nos ressaltos na base da cascata do Buraco Roto e observa-se na vertente ocidental do Cabeço do Poio. As cotas são inferiores ou até próximo dos 250 metros.

 

Mesmo correndo o risco de nos repetirmos nesta referência evolutiva cremos ser importante referir, neste ponto, talvez a sua mais antiga, extensa e expressiva descrição feita por MARTINS (1949) pág. 105: “A escarpa começa a ter importância no relevo um pouco a norte de Alcaria – e já aí com os seus 464 metros está a cavaleiro dos 419 metros da Pragosa, um dos cumes do anticlinal de Alqueidão -;depois, sempre sobranceira a essa dobra (fig. 16), ganha cada vez maior altura a partir da Carreirancha para o norte e na região do Reguengo ergue-se alterosa (fig. 20); mas não tarda que se atenue pouco a pouco, até desvanecer-se inteiramente além da Senhora do Monte, capelinha alcandorada no último tramo a 297 metros”.

 

Figura Nº 3.5 – Corte geológico junto à povoação do Reguengo do Fetal (MARTINS, 1949).

 

E mais adiante, pag.107: ” Se ponderarmos o significado de alguns valeiros secos suspensos (fig. 21), pelos quais se insinuam gargantas de ligação, hoje igualmente secas, nada esclarecemos visto que tanto a deslocação original como um ressoar da falha os poderia ter suspendido; e seja dito que, na sequência de um abaixamento do nível de base ou de um levantamento em bloco da região, e sem mesmo ter havido prévio nivelamento, o desgaste acelerado de materiais brandos situados ao longo da falha no compartimento abatido tenderia a deixar suspensos os vales rasgados na rocha dura. É certo que, em alguns desses valeiros, descortinamos ressaltos que naturalmente correspondem a níveis de erosão – mas a sua interpretação não oferece segurança porque tanto podem ser do jogo da falha como testemunhos da erosão cíclica”.

 

“ Suficientemente esclarecedora é a secção da escarpa que fica a norte da Carreirancha: aí não temos dúvidas de que nos encontramos diante de uma falha exumada, que mantém o sentido do desnivelamento primitivo. Como garantes seguros desta interpretação podem-se apontar as manchas belasianas do Reguengo (fig.20), da Torrinha e da Torre, que nada mais são do que os restos de uma formação detrítica que foi desmantelada por uma recidiva de erosão; e, como acontecia que o Belasiano estivesse em contacto anormal com os calcários duros do Dogger, o plano de falha foi exumado, evolução que mais não representa do que uma simples adaptação à estrutura. Para o sul do Reguengo as formações calco-argilosas do Kimeridgiano em continuidade tectónica com as rochas batonianas tiveram o comportamento de material brando e proporcionaram também a exumação”. RAPOSO, 1981 faz a mesma  descrição e acrescenta:” A escarpa que se pode observar é resultado tanto do primitivo acidente tectónico como da posterior erosão sub-aérea”. Há ainda aspetos antrópicos que potenciam a exumação. Aquando da abertura do desvio descendente da estrada alcatroada que contorna a povoação do Reguengo do Fetal pelo lado Este parece ter havido um deslizamento na formação cretácica com volume considerável.

 

A evolução morfoestrutural local está relacionada fundamentalmente com a existência da Falha de Reguengo do Fetal. Sendo este um aspeto muito importante para a interpretação da evolução das cavidades subterrâneas na zona é notória a necessidade de se obter uma sequenciação com a respetiva cronologia dos eventos de deformação local deste acidente tectónico bem como dos paleocampos de tensão envolvidos. Não sendo este um dos propósitos deste trabalho procuraremos apenas reportar os aspetos da geometria dos principais deslocamentos observados de acordo com a anatomia de uma zona de falha (Vialon, Ruhland e Grolier, 1976) e através da bibliografia e das observações de campo, à superfície e subterrâneas. Referiremos apenas algumas identificações pontuais já que os elementos estatísticos recolhidos em CARVALHO (2013) são completamente esclarecedores. O que nos é dado constatar aqui é uma realidade geológica com um conjunto de estruturas que representa o momento atual de um complexo processo evolutivo na escala do tempo geológico e que se prolongará para o futuro. Assim reportam-se de imediato alguns dos dados já recolhidos.


Observações pontuais

 

Na impossibilidade de se efetuar um levantamento estrutural mais detalhado do bordo do planalto de S. Mamede junto à povoação de Reguengo do Fetal apresenta-se um mapa resumo das observações dos acidentes tectónicos identificados bem como uma pequena descrição fundamentalmente apoiada por imagens de cada um deles. Na representação gráfica as várias direções medidas foram propositadamente exageradas pois, como se verifica, poderão ocorrer outros acidentes tectónicos semelhantes noutros locais ao longo da escarpa de falha.

 

Figura Nº 3.6 – Representação gráfica dos acidentes tectónicos já referenciados: EF1 e EF2 – Direções dos espelhos de falha da Falha de Reguengo do Fetal;

os números a branco indicam a localização das fotos que ilustram os locais assinalados; a linha vermelha indica a direçãoda falha de desligamento

ocidental (FW), a linha amarela indica a direção da falha de desligamento oriental (FE); as linhas cor-de-laranja indicam a microfraturação

da banda de cisalhamento associada à falha oriental. Em tons de azul as orientações cardiais. A verde a projeção em planta

da Gruta do Buraco Roto (Imagem Google earth: projeções tectónicas de Raul Pedro; da gruta de Pedro Pinto).

 

Espelho de falha principal (figura nº 3.6 local - EF 1) – O plano de falha mais recente e de grande dimensão rico em planos polidos, estriados e com fibras de calcite localiza-se junto à povoação que dá o nome à falha. Os indicadores cinemáticos observados denunciam movimentação em desligamento esquerdo mas em que a movimentação segundo a inclinação assume um papel de maior relevo. Com efeito os planos de falha medidos apresentam-se orientados NNW-SSE, com pendores na ordem dos 45º para oeste e abundantes estrias de calcite com inclinação 48º SW (Carvalho, J. 2013). Figura nº 3.7.

 

Figura Nº 3.7 - Plano de falha ainda relativamente bem preservado junto à povoação (figura nº 3.6, local - EF 1) (Foto: Raul Pedro)

 

Figura Nº 3.8 – Plano de falha junto à base da vertente ocidental do Cabeço do Poio (figura nº 3.6, local - EF 2) (Foto: Raul Pedro)

 

 Ainda segundo o mesmo autor a Falha de Reguengo do Fetal perde importância para NNE desta povoação passando a simples alinhamento de fraturas. Contudo, verifica-se que houve uma transferência da sua atividade para o troço que se desenvolve a partir daquela povoação até à aldeia de Torrinhas, segundo NNW-SSE.

Figura nº 3.9 – Zona do contacto Jurássico superior/Jurássico médio a NNE do Reguengo do Fetal.

A foto apresenta maioritariamente as camadas de Montejunto (J3CM). (Foto: Raul Pedro)

 

Fracturação paralela sintética (figura nº 3.6, Nº 6) – Reporta-se uma destas fraturas possivelmente associada a uma fase extensorial da Falha de Reguengo do Fetal (figura nº 3.10).

 

Figura Nº 3.10 - Fracturação paralela ao plano de falha da Falha de Reguengo do Fetal. Imagem da vertente sul.(Foto: Raul Pedro)

 

Falhas de desligamento no Vale do Malhadouro - São ainda observáveis duas outras falhas que pelas atitudes verificadas nos planos de falha indiciam atividade tectónica compressiva podendo ter resultado em ambos os casos de reativações da falha normal em desligamento. A importância local deste tipo de acidentes tectónicos fundamentalmente pela sua disposição e possível relacionamento, em profundidade, com a exsurgência do Buraco Roto criaram a necessidade do seu enquadramento numa área mais ampla. Pontualmente a sua localização também é muito relevante para a interpretação da evolução geomorfológica da vertente em que se encontram bem como do próprio perfil do vale fluviocársico (Vale do Malhadouro).

                                                    

Figura Nº 3.11 – Reportam-se as linhas identificadoras da posição dos dois planos das falhas de deligamento observadas na berma da estrada.

Linhas: vermelha representa o plano de falha da falha ocidental (figura nº 3.6 -FW) e a amarela o da falha oriental (figura nº 3.6 - FE). (Foto: Raul Pedro).

Falha ocidental (figura nº 3.6, falha FW) – Esta falha poderá estar enquadrada possivelmente na inversão tectónica Miocénica sendo um desligamento neoformado.

 

Figura Nº 3.12 – Superfície de desligamento ondulada com estrias. Estas inclinam 5º para SSE (1).

Os pontos 2, 3 e 4 são ampliados a seguir. (Foto: Raul Pedro)

 

  

Figura Nº 3.13 – Ampliações do ponto nº 2 – Plano estriado indicando a direção do movimento (próxima de NW-SE).

Fracturação posterior de direção NNE-SSE. Escala dada por moeda de 5 cêntimos. (Fotos: Raul Pedro)

 

 

Figura Nº 3.14 – Ampliações do ponto nº 3 – Depósito conglomerático de arenitos grosseiros de quartzo aglutinados

por cimento calcitico depositados na base de pequena conduta intersetada pela fratura. Ao lado fotografia de pormenor. (Fotos: Fermando Pires)

 

Figura Nº 3.15 – Ampliação do ponto nº 4 - Pormenor das estrias na zona superior do plano estriado.

Ao lado o seu prolongamento para nível superior. (Fotos: Raul Pedro e Fernando Pires)

 

Esta falha de desligamento apresenta ainda duas particularidades interessantes que permitem identificar:

1 - A existência de um episódio compressivo dada a inversão observada na interseção da junta de estratificação com o plano de falha e também de alguma fraturação local associada (figura nº 3.16 A). 2 - Um pequeno espelho de falha de desligamento, paralelo ao maior e separado deste por apenas 5 cm. Apresenta estrias ligeiramente menos inclinadas. (figura nº 3.16 B).

 

Figura Nº 3.16 – A) Rocha bastante fracionada  nas zonas de pressão.

B) Pequeno espelho de falha estriado paralelo ao mais estenso. (Fotos: Raul Pedro).

 

A determinação da direção e mergulho da falha de desligamento de maior dimensão é complexa visto que o plano de falha não só é visivelmente ondulado ao longo da sua inclinação oblíqua como a orientação e inclinação das estrias, nas zonas mais expressivas, desfasadas em altitude, é diferente (possível consequência da inversão). A atitude desta falha, numa perspetiva lata e abrangente será uma direção N 42º W e um mergulho de 50º SW.

 

Figura Nº 3.17 – Aspeto geral da falha descrita. (Fotos: Raul Pedro).

Note-se que a zona fotografada reporta-se ao talude da estrada sujeito a forte desmonte por explosivos.

Falha oriental (figura nº 3.6, falha FE)  - Bastante mais expressivo é o espelho de uma falha de desligamento a pequena distância que embora apresente estrias menos bem marcadas, possivelmente por uma maior exposição ao intemperismo, apresenta um plano de falha mais extenso e com as estrias horizontais indicando neste caso um movimento de direção próximo do NNW-SSE. Direção N 27º W e mergulho 70º E.

Figura Nº 3.18 – Plano de Falha de desligamento. (Foto: Fernando Pires)

 

 

Figura Nº 3.19 - Espelho de falha com estrias horizontais. Observação das estrias no espelho de falha. (Foto: Raul Pedro)

 

 

Figura Nº 3.20 – Pormenor das estrias e ao lado observação da continuação ascendente do plano de falha. (Fotos: Fernando Pires)


Microfracturação em banda de cisalhamento associado à falha de desligamento – Na proximidade do plano de falha de desligamento referido observam-se para NNE e ao longo de vários metros grande número de fraturas paralelas entre si (família) que poderão eventualmente camuflar outras falhas de desligamento associadas (o local requer uma análise cinemática de pormenor). Apresentam um evidente angulo com o plano de falha de desligamento.

 

Figura Nº 3.21– Sequência de fracturas  junto à falha de desligamento que poderá incluir outras falhas associadas (interpretação das figuras nº 3.21 e 3.22).

As fracturas prolongam-se ao longo de várias bancadas (A – Ponto de referência para transição). (Fotos: Fernando Pires)

 

Figura Nº 3.22 – Pormenores da deformação na banda de cisalhamento associada: B - Na base da escarpa

e C - No topo em continuação para NNE. (Foto: Raul Pedro e Fernando Pires)

Como se pode verificar pela figura nº 3.23, quando as descontinuidades estão parcialmente abertas, (zona nº5 dessa figura) potenciam a ação mais rápida da erosão superficial sendo a causa da alteração do perfil da vertente. Em profundidade e associadas ao ligeiro mergulho das camadas para Este controlam, em conjunto com as juntas de estratificação, a organização das escorrências subterrâneas.

Figura Nº 3.23 - Falha de desligamento (1). Sistema pervasivo de microfacturas associadas à falha identificável no talude da estrada

(2). Pequeno campo de lapiás de agulha, coberto, na base da escarpa (3). Modelado superficial na vertente Sul do cabeço do Rebelo

evidenciando o prolongamento deste acidente e da fracturação associada (4). Prolongamento para nível estratigráfico superior. (5). (Foto: André Reis)

 

Próximo do topo desta vertente observam-se formas superficiais que sugerem lapiás de agulha. Estas formas são resultantes da erosão das microfraturas paralelas que se prolongaram até este local.

 

Figura Nº 3.24 – Junto ao topo da vertente SW do v.g.d. do Rebelo observam-se, à superfície, alinhamentos de calcários enquadráveis

na tipologia de lapiás de agulha parcialmente enterrado que correspondem ao afloramento dos calcários entre

as descontinuidades verticais paralelas e associadas à falha de desligamento oriental (figura nº 3.6 zona do número 5). (Fotos Fernando Pires)

Seguindo no alinhamento desta banda de cisalhamento para Norte verifica-se também aí a existência de microfraturação paralela que apresenta orientação próxima de NNE.

Descontinuidades quase paralelas à banda de cisalhamento do Vale do Malhadouro – No enfiamento e eventual prolongamento da fracturação descrita fica a entrada do Buraco Roto. No seu lado Norte e ao longo da continuação da parede quase vertical observa-se microfraturação bastante semelhante à existente no Vale do Malhadouro (banda de cisalhamento – figura nº 3.6 - zona número 4)

Figura Nº 3.25 – Foto nº1 - Microfraturação paralela identica à observada junto à falha de desligamento oriental no Vale do Malhadouro

e localizada poucos metros a Norte da entrada do Buraco Roto (figura nº 3.6 – foto número 1). Foto nº 2A– Zona dos primeiros ressaltos

da cascata a SW do ponto núnero 2 identificado por seta vermelha. (Fotos Raul Pedro)

Perto do rebordo dos primeiros ressaltos da cascata apresenta a configuração da foto que se segue. Os indicadores estão muito alterados por ação antrópica. Provavelmente esta zona terá sido exposta nas atividades tectónicas mais recentes sobre a falha principal e sujeita a forte ação de meteorização. A zona final dos maiores ressaltos por onde cai em cascata a água da exsurgência poderá pertencer ao plano de Falha de Reguengo do Fetal.

 

Figura Nª 3.26 – Possível banda de cisalhamento no rebordo inicial da cascata do Buraco Roto (figura nº 3.6 zona do número

2). Idem a cota mais elevada nas imediações ao longo do carreiro a sul da cavidade (figura nº 3.6 zona do número 3). (Fotos: José Ribeiro e Raul Pedro)

Em antiga pedreira a NW do vgd do Reguengo podem observar-se várias fracturas verticais paralelas com direção semelhante às observadas junto à entrada do Buraco Roto (ligeira rotação para a direção N).

 

Figura Nº 3.27 – Fracturação paralela eventualmente associada a falha de desligamento (não observada).

Observa-se em pedreira aparentemente abandonada. (Foto: Raul Pedro)

Brechas de falha – Foram observadas em algumas fendas (fraturas com ligeira abertura) e recolhidas nas imediações, no exterior, fora de contexto, amostras de brechas de falha contendo pequenos clastos calcários de natureza idêntica à da rocha aflorante na envolvente. As observadas a nível inferior aparentam ser as mais antigas. As que se encontram embutidas no espelho de falha da Falha de Reguengo do Fetal poderão ser designadas por brechas tectónicas (Figura nº 3.28).

Figura Nº 3.28 - Pormenor de uma brecha de falha, mais antiga com alguns clastos arredondados

e com aparente fracturação posterior à sua consolidação. (Foto: Raul Pedro)

 

  

Figura Nº 3.29 – Amostras de brecha de falha. (Foto: Raul Pedro)

 

3.3 – Em jeito de conclusão

 

O importante desenvolvimento vertical da família de descontinuidades paralelas observadas no Vale do Malhadouro e a sua possível longa extensão para NNW foram relevantes na evolução do rebordo superior de toda a sua vertente Norte. Aparentam também terem influenciado a evolução de parte da escarpa de falha da Falha de Reguengo do Fetal a sudeste desta povoação.

 

Algumas observações realizadas na zona do Cabeço Rebelo, parte terminal da vertente Norte do Vale do Malhadouro e encosta da escarpa de falha de Reguengo do Fetal em continuação para Norte indiciam que as descontinuidades verticais atrás referidas não têm correspondência semelhante na parte mais baixa da escarpa de falha nesta zona. Esta família de descontinuidades paralelas que se desenvolve de forma expressiva nos calcários oolíticos do Batoniano parece não se ter prolongado para os calcários micríticos da Serra de Aire subjacentes.

 

Figura Nº 3.30 – Ponta ocidental da vertente Norte do Vale do Malhadouro

 

Na microfraturação em banda de cisalhamento associada à falha de desligamento que designámos por oriental poderá, no entanto, ser possível haver algumas fraturas com prolongamento para as camadas a maior profundidade (calcários micríticos da Serra de Aire).

As reativações da Falha de Reguengo do Fetal e a exumação da escarpa de falha na zona a leste da povoação que dá o nome à falha também foram fundamentais na evolução superficial e subterrânea nesta parte do bordo Oeste do Planalto de S. Mamede.

AGRADECIMENTO

Agradecemos o prestimoso contributo do Prof. Dr. José Carlos Kullberg do Departamento de Geologia da Universidade Nova de Lisboa na revisão deste texto sobre o enquadramento tectónico nesta parte do MCE e ainda pelo esclarecimento e explicação detalhada de algumas dúvidas.

 

BIBLIOGRAFIA

CARVALHO, J. M. S. (2013) – Tectónica e caracterização da fracturação do Maciço Calcário Estremenho; Bacia Lusitaniana. Departamento de Geologia da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, Lisboa.

CUNHA, P.P.; PAIS, J.;LEGOINHA, P. (2009) – Evolução geológica de Portugal continental durante o Cenozóico – sedimentação aluvial e marinha numa margem continental passiva (Ibéria ocidental). 6º Simposio sobre el Margen Ibérico Atlântico MIA09. Oviedo.

KULLBERG, J.C., MACHADO, C. (2006) – Cartografia Geológica do Mesozóico na AML e aspectos relativos à normalização. O caso da área Metropolitana de Lisboa. Cartografia Geológica Aplicada a Áreas Urbanas. Alcochete, pp 49-61.

MARTINS, A. F. (1949) – “Maciço Calcário Estremenho”. Contribuição para um estudo de geografia física. Coimbra, Editora.

RAPOSO, H. S. (1981) – Parque Natural das Serras de Aire e Candeeiros. Plano de Ordenamento 1ª Parte. Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico. Lisboa

 

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