1 - Um pouco de história
Algar já referenciado nos anos 70 em trabalhos da Sociedade Portuguesa de Espeleologia (SPE), nunca foi, nesses tempos antigos, uma cavidade interessante para alguns espeleólogos pois subir o seu poço de entrada por escadas era um custo elevado para uma cavidade sem grandes perspetivas.
Em meados da década de 80 aquando da visita de trabalho de C. Thomas a Portugal a sua exploração e topografia foram efetuadas em conjunto com a Sociedade dos Amigos das Grutas e Algares (SAGA). As gralhas fossilizadas sob fino manto de calcite e os ossos de felino tornaram-na mais interessante. A progressão por corda facilitou as explorações.
A primeira visita do CEAE-LPN à Malhada de Dentro foi efetuada no ano de 1985 no seguimento das prospeções nas encostas NNW e N da Serra de Aire (Maxieira/Bairro). Coincidiu com as últimas explorações na zona por interposição de outros projetos.
O reinício das visitas à gruta remonta a 2003 e foi orientada pela monitorização dos morcegos. Prolongou-se até 2004. De novo outros projetos nos desviaram a atenção desta cavidade.
Em 2008 surge uma pequena equipa entusiasta da região do Bairro que explora algumas das cavidades da zona bem como as partes não referenciadas da Malhada. São descobertas novas continuações mas também vestígios de já terem sido visitadas anteriormente.
No fim do 1º trimestre de 2011 iniciou-se um projeto de levantamento topográfico da gruta para acrescentar essas zonas não publicadas por THOMAS (1985). Verificou-se que grande parte já tinha sido anteriormente explorada pela recuperação de material espeleológico perdido ou abandonado, em tempos passados, bem como pela equipagem de algumas escaladas para níveis superiores.
No entanto, foram exploradas e topografadas algumas pequenas continuações novas e feitas novas escaladas. A topografia efetuada ultrapassou os 1000m. Em 2011 foi feita uma desobstrução que permitiu aceder a um novo tramo com cerca de 360m de novas galerias entretanto topografadas. A poligonal atual ultrapassa os 1600m.
2 - Localização
O Algar da Malhada de Dentro localiza-se na periferia SW da malha urbana da povoação do Bairro, que pertence à freguesia de Nossa Senhora das Misericórdias, concelho de Ourém. Esta povoação encontra-se anichada na base da encosta setentrional da Serra de Aire a cerca de 10 km a SE de Fátima.
Fig. 1 – Excerto da carta geológica 27-A Vila Nova de Ourém com a localização
do Algar da Malhada de Dentro.
3 - O relevo local
A Serra de Aire é a elevação mais alta do Maciço Calcário Estremenho com 678m. É uma importante deformação anticlinal com eixo NE-SW. A direção estrutural é marcada pelas vertentes dos relevos anticlinais que prolongam a Serra de Aire para Nordeste. A partir da Goucha Larga (547m) o seu eixo sofreu uma ligeira inflexão para NNE e os flancos que se preservaram, neste local, vão perdendo progressivamente altura ao longo de vertentes retilíneas. No seguimento para NNE a altitude diminui bastante mas conservou-se um alinhamento de cabeços: Alto do Vale das Porcas (362m), Cabeço dos Casanhos - Pedreira do Galinha (342m), vértice geodésico (v.g.) da Lagoa (360m) com um prolongamento ainda mais extenso para NNE mas já fora da zona em apreço.
A partir da Goucha Larga e ao longo da sua vertente NW-N, no prolongamento da serra, a suave pendente até à cota dos 400m torna-se mais inclinada até à cota dos 350m, voltando depois a ser mais suave até aos 307m (grande dolina do Bairro). No Sardaçal instalou-se um vale seco, bem marcado designado por Vale de Figueira a que se junta um outro, ainda insipiente, proveniente de dentro da povoação.
A NW da povoação, o cabeço do moinho (v.g. do Casalão) com 329m de altura permitiu a manutenção de uma vasta zona relativamente aplanada próxima ou ligeiramente acima dos 300m (que designaremos por plataforma do Bairro). O cabeço prolonga-se ligeiramente para Norte constituindo um pequeno bastião rochoso residual próximo dos 300m que margina, desse lado, o vale do Sobral logo a partir da sua cabeceira.
A Lagoa, pequena depressão circular, com água, localiza-se um pouco abaixo do vértice geodésico com o mesmo nome, e a uma cota próxima dos 350m. Revela a existência de depósitos aluviais em toda a sua envolvente. Esta observação está de acordo com as descrições de Fernandes Martins (1964) sobre a evolução terciária dos níveis do Planalto de S. Mamede/Fátima.
As portelas, imediatamente a Norte e a Sul da Pedreira do Galinha sugerem erosão mecânica de possíveis correntes superficiais sendo cabeceiras de vales secos que mordem a encosta leste da Serra de Aire. O vale instalado a Norte é muito marcado e com orientação SSE.
De acordo com RAPOSO (1981), os níveis das plataformas de Fátima são formados por aplanamentos com origem em erosão normal, formando depósitos detríticos superficiais siliciosos e aluvionares.
Para se poderem formar estes níveis de aplanação deveria existir uma certa proximidade entre a superfície dos calcários e o nível de base, condição indispensável para a instalação de uma rede superficial de drenagem. As aplanações viriam a ser interrompidas por levantamentos do bloco calcário e/ou abaixamento do nível de base, de modo que os cursos de água superficiais passariam a circulação subterrânea. Note-se o importante papel do relevo na organização dos escoamentos, quer superficiais, quer subterrâneos.
O primeiro nível de erosão (de Pias) dataria do Oligoceno e o segundo (de Fátima), seria possivelmente ante-plaisanciano, ou seja, anterior ao Pliocénico (RAPOSO 1981).
3.1 - As depressões urbanas do Bairro
A povoação do Bairro encontra-se instalada numa zona aplanada, possível patamar, ligeiramente deprimida em relação ao alinhamento de cabeços (já descrito) que a marginam a Este. Apesar de todas as alterações provocadas pela humanização do local conservam-se ainda, até aos nossos dias, duas dolinas de dimensões apreciáveis que fariam parte de uma uvala mais vasta descaracterizada pela urbanização. Apesar de algum aparente alinhamento das formas deprimidas, como se pode ver pela foto nº1, não nos parece haver um sotch.
Foto nº 1 – Panorâmica da vasta depressão cársica entre a Pedreira do Galinha
e a povoação do Bairro, que ocupa uma parte da sua área (foto: Paulo Camelo)
A de maiores dimensões (grande dolina do Bairro) que é manifestamente a forma superficial mais importante na zona urbana e da periferia do Bairro, está à cota de 307m (ponto mais baixo 302m) e inicia-se a Sul da Estrada de Fátima prolongando-se para Sul (mais de 350m) entre as ruas do Sargaçal e do Barranco. A sua orientação é sensivelmente N-S e a largura é quase uniforme e próxima dos 160m. Na sua extremidade Sul existe ainda um prolongamento do aplanamento embora com ligeiríssimo declive ascendente que se divide em dois ramos: um para Este, marginal da pedreira do Galinha (portela a 320m de altitude que é a cabeceira de um valeiro seco que desce para o Chão da Serra, a Sudeste, e, um prolongamento que afunilando, se insinua como esboço de valeiro seco para Sul, com campos de cultivo seguidos de olivais e que se prolonga por mais de duas centenas de metros com inclinação ascendente progressivamente de maior pendor.
A grande dolina do Bairro é uma dolina dissimétrica alongada que evoluiu em função de condições topográficas favoráveis que serão descritas embora sucintamente na morfologia superficial. Poderá ser integrada numa forma mais vasta “uvala do Bairro” muito mascarada pela malha urbana, nela instalada. A sobrelevação da Estrada de Fátima acabou por amputar a grande dolina de uma pequena parcela que se encontra a Norte dela e pela sua própria localização e sobrelevação mascarar outras coalescências.
A segunda depressão com cota de 302 m encontra-se a NW da portela entre o Cabeço da Lagoa e o da Pedreira do Galinha. Aparenta ter sido um ponto de drenagem superficial para Sudeste. Parece ter sido mais intervencionada pelo menos marginalmente e estende-se desde a referida Portela até à rua da Cruz, rua do Cemitério e Rua da Farmácia. É sugestivo o nome da rua que a margina a Este, Nordeste e Norte: rua da Lagoa. A lagoa, de pequenas dimensões, encontra-se perto do topo do cabeço com o mesmo nome.
O vale seco que se instalou no Sardaçal prolonga-se pelo Vale de Figueira (carsificado) cujo leito, junto à estrada a Este do Bairro, se encontra à cota dos 300m e que continua para Noroeste atingindo a cota de 286m no Chão de Barreiros (eventual sentido das principais drenagens subterrâneas). Em alguns troços do vale o fundo é amplo e pouco afeiçoado apresentando rebaixamentos periódicos, para jusante, devido aos muros que sustêm as parcelas agrícolas. Em alguns locais apresenta vertentes em U bem marcadas.
4 - Morfologia superficial
O Algar da Malhada de Dentro abre-se nos calcários micríticos de Serra de Aire (J2SA) que afloram a Sul da povoação do Bairro. A inclinação das camadas, numa zona mais abrangente (malha urbana, pedreira do Galinha) é para W e varia entre 20º e 10º diminuindo consoante a altitude a que estas se encontram. Na zona urbanizada foram mascaradas praticamente todas as formas superficiais, situação que embora não tão visível num perímetro periférico mais alargado é também observável: arroteamento e socalcos para olivais.
À superfície é de notar algumas zonas, de encosta, onde o calcário se apresenta nu, evidenciando a sucessão das bancadas calcárias sensivelmente inclinadas. A criação de exíguos socalcos permitiu o aparecimento de espaços aplanados que apresentam uma ligeira camada de solo sendo ainda visíveis, alguns sinais de atividade agrícola num passado recente (ultimo século, olival). A Sul, Serra acima, e na encosta a Oeste da dolina encontram-se algumas pequenas áreas de lapiás que contribuem de forma importante para a rápida absorção das águas pluviais. São um tipo de lapiás particular. O lapiás de juntas de estratificação é aqui pouco expressivo já que a atitude das camadas favorece a infiltração e o aparecimento de pequenos espaços de terra rossa entre os estratos colmatando as juntas de estratificação e as diáclases subjacentes. Nas zonas de menor declive todos os interstícios da rocha estão colmatados.
Se a inclinação das camadas e a sua aparente uniformidade (pedreira do Galinha – pegadas) é um fator importante para a evolução superficial a variação da sua direção entre N e N10E potencia a organização das infiltrações.
Assim, a grande dolina do Bairro é uma dolina dissimétrica cuja evolução reflete a ação conjunta de fatores de corrosão, dissolução e erosão mecânica dos calcários.
No seu bordo Oeste observam-se estreitas faixas de terrenos aplanados, que lhe são paralelos e que são testemunhos de uma maior largura do felgar em tempos geológicos passados. A Lapinha do Bairro, numa dessas faixas, foi um antigo sumidouro num desses períodos.
Estão ainda referenciados vários pontos de possíveis aberturas para ocos em profundidade a cotas ligeiramente mais elevadas (320m) que o atual chão da dolina.
Fig. : 2 – Esboço de bloco diagrama da metade Sul da Grande dolina do Bairro (Raul Pedro).
Na periferia do Algar da Malhada de Dentro estão referenciadas várias zonas deprimidas que poderão estar relacionadas com fases anteriores do fundo da grande dolina (mais elevado). É, pois, perfeitamente aceitável que também aqui (330m) tenham existido aluimentos de blocos pelo afundamento de terra rossa provocada por antigos sorvedouros.
Mas a grande dolina do Bairro não deixou de evoluir. Sendo a área aplanada do chão da dolina muito vasta e a água superficial no felgar conduzida preferencialmente, para o seu bordo Oeste onde se junta à escorrência superficial dessa zona mais inclinada, acabou por abrir passagem para ocos inferiores e consequentemente algum afundamento do solo, próximo dessa zona marginal, como se ilustra no bloco diagrama acima. No rebordo Oeste do atual fundo da dolina e, num local intermédio, na terra rossa, observa-se uma cova bastante declivosa e com vários metros de desnível. Poderá converter-se numa dolina embutida. É no entanto uma forma demonstrativa de que esta dolina está em processo de rejuvenescimento.
Não são feitas, neste trabalho, referências ao exocarso a Oeste do Bairro (Casal Farto) embora esta zona também se enquadre na mesma evolução da base da encosta setentrional da Serra de Aire nem à zona, mais vasta que se prolonga para Nordeste até à bacia de afundamento de Vila Nova de Ourém (bacia cretácica de Ourém).
5 - Morfologia subterrânea
Revela-se particularmente interessante o relacionamento entre as grandes dolinas urbanas e as possíveis drenagens subterrâneas particularmente no que respeita à grande dolina.
A proximidade da Lapinha do Bairro e o seu desenvolvimento próximo da superfície sugerem a existência de um sumidouro, numa fase em que o rebaixamento do fundo da dolina ainda não era tão grande. A entrada atual localiza-se na primeira faixa aplanada paralela ao chão da dolina e a uma cota ligeiramente mais elevada. O seu desenvolvimento subterrâneo indicia um nível fóssil de drenagens relativamente próximo da superfície. Esta cavidade teve outros acessos ao interior que foram tapados. Entrada vertical sob o bordo do pavimento da estrada asfaltada. E um outro na zona terminal ascendente, propositadamente obstruído, já muito perto do atual bordo da grande dolina.
As outras formas de absorção abertas numa área mais abrangente apresentam um acentuado desenvolvimento vertical logo à entrada e se o Algar da Cerejeira não permitiu aceder a profundidade superior a 20 metros por aparentemente ser um vazadouro de lixo local, o Algar da Malhada de Fora apesar de estar atulhado por bastantes blocos a 18 metros de profundidade aparenta ter uma ligação mais profunda às galerias da Malhada de Dentro possivelmente através de uma estreita fenda lateral também muito preenchida por blocos ou por uma outra onde se consegue descer até 21 metros . O Algar das Bombas já nos calcários Oolíticos de Fátima (J2Fa) merecerá uma abordagem mais detalhada devida a essa particularidade (provavelmente um relatório independente). Mas a cavidade mais importante na envolvente da povoação do Bairro é o Algar da Malhada de Dentro cujas dimensões espeleométricas já são relevantes apesar de a sua exploração não ter ainda terminado e estas poderem ser possivelmente aumentadas (1600m de desenvolvimento e 94 metros de profundidade).
Lapinha do bairro
À Lapinha do Bairro acede-se por um ressalto em rampa muito inclinada com 3 metros de desnível. Um ligeiro encurvamento para Este e uma menor inclinação da rampa por mais 5 metros permitem avançar até uma zona mais desafogada e com maior altura devido a uma pequena diáclase com orientação WNW-ESE. A parte terminal desta pequena diáclase interseta a diáclase principal da gruta na sua extremidade Sul. Acede-se deste modo à grande diáclase com orientação geral aproximadamente N-S.
No chão desta parte inicial são as argilas que predominam. O seu arrastamento para zonas mais interiores no início da grande diáclase originou uma vasta e elevada rampa. As formas de reconstrução foram-se edificando sobre esse tapete. Posteriormente a argila foi arrastada e as formações colapsaram. Na parede Este da diáclase e a bastante altura ficou como testemunho, deste nível de depósitos, um prato base estalagmítico com dimensões apreciáveis. Na parede oposta, num recanto em patamar sensivelmente horizontal, menos elevado, observam-se vestígios de areias. Poderão ser provenientes do exterior já que na vertical e no teto do patamar existiu uma abertura para a superfície (berma da estrada atual).
A inclinação da galeria que se desenvolve ao longo da diáclase é bastante uniforme e desce segundo um ângulo médio próximo dos 20º. Por vezes a inclinação é quebrada por blocos abatidos, já parcialmente recobertos por mantos estalagmíticos, que disfarçam pontualmente essa pendente. Durante todo este troço descendente (+-50 m) a diáclase, vertical, apresenta-se bem desenvolvida em altura, geralmente entre os 5 e 7 metros.
Foto nº 2 – Galeria principal da Lapinha do Bairro
As secções, em corte, ao longo da descida da galeria são triangulares sendo a base do triângulo, em geral, inferior a metade da sua altura. Há vestígios evidentes de erosão em conduta livre. À medida que nos aproximamos da maior profundidade da gruta (18 m) verifica-se um alargamento do chão da galeria que se apresenta sensivelmente horizontal por cerca de 10 metros. A diáclase no teto atinge os 9 m de altura tornando este espaço a área mais ampla da cavidade. Simultaneamente era a zona para onde confluíam as drenagens já que a continuação da diáclase para Norte é a partir daqui ascendente apresentando uma notória diminuição de altura e também uma progressiva descaracterização dos cortes transversais triangulares típicos da parte inicial. A altitude da diáclase no tramo ascendente poderá pontualmente chegar aos 5 metros mas, em geral, é muito inferior. Na parte terminal deixa de existir preponderância da diáclase e aparece uma sala superior suspensa, com preenchimento envolvente de clastos e argila. Na ponta terminal a superfície estará aproximadamente a 6 metros acima do teto.
Algar da Malhada de Fora
O Algar da Malhada de Fora apresenta uma boca retangular e relativamente espaçosa com 1 X 0,70m que comunica com um desenvolvimento vertical, com esta configuração, até dois metros de profundidade. A rocha é bastante lisa sugerindo uma substancial infiltração superficial. O epicarso na zona circundante da boca é bastante declivoso e se a área envolvente a Sul apresenta um pendor suave e continuo na continuação da encosta, a parte a Nordeste da boca revela um amontoado de grandes blocos, aparentando serem uma barreira. Esta observação faz supor não ter sido só a ablação superficial descendente a forma de abertura à superfície deste algar absorvente. Abaixo dos dois metros o poço alarga bastante (diâmetro da ordem dos três metros) mas mantem sensivelmente o perfil rectilínio. As paredes envolventes apresentam-se relativamente concrecionadas ao longo de todo o seu desenvolvimento e até ao fundo.
Aí, a 18 metros de profundidade, um vasto chão de blocos ocupa todo o espaço. É visível, num recanto a Este, uma pequena continuação ao longo de uma fenda que se pode descer por apenas 2m. No fundo abre-se uma pequena galeria, sem continuação, que apresenta alguma argila e formas de reconstrução. Num outro recanto do fundo, a Sul, observa-se uma pequena fenda descendente, que se abre, na parede, junto aos blocos do chão e que apresenta ser uma possível continuação. O pequeno pedaço de teto, não indicia grande queda de blocos por falta de sustentação.
Uma análise superficial parece indiciar que os blocos que cobrem o fundo do poço, relativamente horizontal poderão ser provenientes de uma ou várias tentativas de entulhamento da cavidade.
À semelhança das cavidades vizinhas observa-se que também este é um algar de vazamento de lixo doméstico e de animais.
Sendo aparentemente insignificante no que respeita ao seu desenvolvimento espeleométrico e espeleogenético, este algar poderá ser importante para a identificação de possíveis formas de absorção abertas a drenagens subterrâneas de escorrências superficiais mais importantes.
Algar da Cerejeira
Será objeto de um relatório separado que será integrado num trabalho de campo específico (em preparação) para esta cavidade.
Algar da Malhada de Dentro
Será objeto de um relatório separado dada a sua dimensão, importância e complexidade.
Algar das Bombas
Será também objeto de um relatório independente devido a particularidades específicas.
Foto nº 3 -Implantação à escala sobre imagem do Google Earth do Algar da Malhada de Dentro e restantes cavidades
nas imediações (Bombas, Cerejeira, Malhada de Fora e Lapinha do Bairro)
6 – Conclusão
A orografia peculiar deste bordo da Serra de Aire e a sua organização espacial criaram várias zonas importantes para uma evolução morfológica superficial bem desenvolvida (dominância dos processos de corrosão e/ou dissolução) e, paralelamente, para uma organização das drenagens subterrâneas ao longo de coletores ainda não localizados, mas que estarão abaixo dos coletores fósseis, escalonados em vários níveis, resultantes das condições topográficas e sucessivos ambientes bioclimáticos que afetaram esta região num passado geológico mais distante.
A promiscuidade das cavidades com a urbanização e ocupação humana provocou na maioria dos algares e grutas perturbações importantes. São exemplo disso a Lapinha do Bairro e os Algares da Malhada de Fora, da Cerejeira e das Bombas.
As alterações efetuadas, pelos proprietários, nos quintais e terrenos agrícolas ao longo dos tempos mascararam, eventualmente, as antigas formas superficiais. Há, no entanto, algumas que pela sua dimensão perduraram até ao presente embora parcialmente alteradas. É também muito provável que outras cavidades tenham sido entulhadas ou cobertas pelos próprios donos para evitar acidentes ocasionais, nivelarem os terrenos de cultivo e obstruírem o afundamento de terra rossa.
Apesar dessa eventual lacuna, com o conjunto das cavidades mencionadas, é possível vislumbrar uma interpretação da forma como as drenagens subterrâneas se organizaram e se desenvolveram e, ainda, em função das respetivas topografias a importância e hierarquia dos coletores já identificados.
Os aquíferos subterrâneos locais estarão por certo contaminados especialmente as captações em poços. O nível de nitratos poderá apresentar índices elevados. A utilização dessa água para a rega das pequenas parcelas agrícolas vai aumentando, ao longo dos anos, os teores de nitratos pela utilização ocasional de adubos.
Na ausência de nascentes cársicas nas possíveis e prováveis zonas de afloramento das águas devida à cobertura com depósitos detríticos e com os dados espeleométricos atualmente coletados não nos é possível identificar de forma clara se existe um coletor principal das drenagens subterrâneas já que se supõe que as mesmas se irão diluir no nível piezométrico local. Muito provavelmente qualquer hipótese da sua existência será a um nível inferior ao nível freático (permanentemente submersa).
O Algar da Malhada de Dentro encontra-se presentemente numa fase intensa de trabalho e com uma equipa de espeleólogos de CEAE dedicada. Sendo a cavidade motor deste projeto necessita igualmente de uma avaliação semelhante nas cavidades próximas para se poder fazer uma interpretação local mais fidedigna.
Os levantamentos topográficos têm ocupado a maioria do nosso tempo. A descoberta de novas condutas e a necessidade de várias escaladas para acesso a níveis superiores tem consumido muito do tempo de exploração. Apesar dos mais de 1600m já topografados há ainda bastante para fazer.
Os trabalhos fotográficos ocuparam e ocupam também uma grande fatia das disponibilidades existentes. Tudo isto tem criado, como consequência, o relativo atraso na verificação e medição das inúmeras descontinuidades observadas e na interpretação de outras formas e indicadores para apoiar a descrição da espeleogénese da Malhada de Dentro.
Poder-se- á parafrasear o desabafo de um dos exploradores: Começou como uma experiência prática insignificante. Agora é Gruta para uma vida.
BIBLIOGRAFIA:
MANUPPELLA, G. (coord.); ANTUNES, A. T.; ALMEIDA, C. A. C.; AZERÊDO, A. C.; BARBOSA, B.; CARDOSO, J. L.; CRISPIM, J. A.; DUARTE, L. V.; HENRIQUES, M. H.; MARTINS, L. T.; RAMALHO, M. M.; SANTOS, V. & TERRINHA, P. (2000) – Carta Geológica de Portugal, escala 1:50.000. Notícia explicativa da Folha 27-A (Vila Nova de Ourém). Instituto Geológico e Mineiro, Lisboa, 156p.
MARTINS, A. F. (1949) – Maciço Calcário Estremenho, contribuição para um estudo de Geografia Física, reimpressão fac-similada (1999), Coimbra, 248p.
RAPOSO, H. S. (1981) – Parque Natural da Serra de Aire e Candeeiros, Plano de ordenamento , 1ª Parte. Serviço Nacional de Parques, Reservas e Património Paisagístico, Lisboa, 97p.
THOMAS, C. (1985) - Grottes et Algares du Portugal, Comunicar, Lisboa, 230p.